Reavaliando a Relação

11:21


No início deste ano alguns pacientes chegaram com constatações muito parecidas. Amigos que encontrei também relataram suas vivências e tiveram as mesmas considerações. Todos perceberam que estavam sonhando sozinhos. Lembrei-me de uma história, a qual considero um dos mais belos romances reais que tive a oportunidade de presenciar. Não farei uma descrição dessa história, porque necessitariam de muitos capítulos. Mas num breve resumo posso relatar que se conheceram numa praia, e ao trocarem olhares, na perspectiva dessa minha amiga, seus mundos se alteraram. Moravam em cidades diferentes e após quatro meses de telefonemas constantes, resolveram se encontrar. Foi o primeiro toque, primeiro beijo, primeiro abraço. Saiu tudo perfeito. Para ela parecia a gravação de uma novela. Não teve um movimento errado. E assim se passou um ano. Um ano de reencontros, mensagens no celular, e-mails, declarações constantes, embalados por muita música, e música, e músicas. Nunca vi um casal com uma trilha sonora tão extensa. Tinham música para todos os momentos. Minha amiga fartou-se de CDs. Pensei que nunca acabariam. Não discutiam, porque mesmo tendo motivos sempre souberam agir assertivamente. Sentiam quando um precisava do outro. Era lindo, mas... Um dia acabou.

Nesse caso imagino que a distância tenha sido desfavorável e contribuído com boa parte para o desfecho da história, mas antes disso, após esse ano intenso de conquistas, seguiu-se meio ano de descuido. Ele insistia na continuação, mas a custo zero. Ela começou a perceber que as mensagens, mesmo durante o ano em que estiveram muito bem, eram iniciativa dela, e que ele as mandava sim, lindas mensagens, mas como resposta. Começou a perceber que havia enviado cartas, presentes, feito surpresas, e que nunca foi surpreendida. Que recebeu flores sim, mas numa data totalmente esperada. Não eram os presentes que contavam, mas o que poderiam significar: carinho, consideração, importância. Poderia ter sido um único bombom, num dia qualquer. Os apaixonados têm a necessidade de ver o sentimento do outro no concreto, não importando o valor, o tamanho, mas a frequência e a intensidade com que essa demonstração é realizada.

Eu como presenciei toda a história desde o início, me senti bastante triste quando um dia ela chegou, após muito tempo de tensão, incertezas, inseguranças, lágrimas e me disse, nesse momento muito calma: “ Só agora eu percebi, o que nem ele ainda percebeu. Que ele já se retirou há muito tempo, e eu venho sonhando e caminhando sozinha há milhas.

Tudo o que muitos querem é amar. Encontrar alguém que faça bater forte o coração e justifique muitas de nossas loucuras. Eu te amo no início é fácil, assim como declarações românticas, que apesar de muito bom, sozinhos não sustentam um relacionamento, até porque não temos nenhuma garantia da durabilidade, e isso causa muita insegurança e nos fragiliza constantemente. Para manter um relacionamento é preciso uma sedução ininterrupta das duas partes e uma turma de atitudes para nos amparar. Farei uma adaptação de um texto bíblico, tentando sugerir atitudes que possam vir a contribuir para uma caminhada mais duradoura.

Há tempo de abraçar bem forte, e apenas com o olhar declarar todo seu amor. Há tempo em que precisará mais do que palavras, precisará de gestos mais concretos. Há tempo em que o olhar, as palavras e os gestos mais concretos não servirão. Há tempo que somente o silêncio será entendido.

Há tempo de cantar, em vez de reclamar, de sorrir, em vez de franzir a testa, de enxugar as lágrimas com um beijo e apesar de o outro ter errado, dizer que ainda assim o ama e o admira. Há o tempo de cada um, com amigos, com seu trabalho, consigo mesmo. Sempre é tempo de a vida própria ser respeitada.

Há o tempo de responder à todas as perguntas, porque poderá vir o tempo em que o outro não queira mais ouvir suas respostas. Mas haverá o tempo em que não se deve perguntar nada e esperar o tempo passar. Há o tempo de se fazer tolices, de ter acessos de carência, de infantilidade, de não reagir bem aos imprevistos. Mas há o tempo da maturidade.

Sempre não ao tempo da competição, da comparação. Sim ao tempo da cumplicidade, da delicadeza dos atos e das palavras, da disposição para ouvir, da confiança em falar. Há o tempo de se bater a porta. Mas há o tempo de se pedir desculpas, de ter paciência.

Há o tempo de pedir explicações, e o tempo de dá-las. Há o tempo de dar colo, e o tempo de pedi-lo. Há o tempo de se aproximar, e o tempo de se afastar.. Há o tempo de ficar um pouco, e mais um pouco, e um pouco mais. Há o tempo de respeitar. E para isso não existe opção contrária.

Há tempo de dar presentes, porque pode haver o tempo em que eles não tenham mais importância. Há o tempo do toque, do abraço, do beijo, de fazer amor com carinho, amor com fúria, amor por amor. 

Mas cuidado com o tempo entre os tempos. 

Se você deixar o outro esperar demais, poderá não haver mais tempo.

Quanto a minha amiga. Apareceu outro, que caminha junto, afinal, também há o tempo de nos dar outra chance.

Luciana Sereniski
CRP 12/06912

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